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Mortes por suicídio no Ceará em 2022 ultrapassam óbitos por acidente de moto; saiba onde obter ajuda

Mortes por suicídio no Ceará em 2022 ultrapassam óbitos por acidente de moto; saiba onde obter ajuda

Legenda: Falar sobre prevenção ao suicídio e fortalecer rede de atendimento à saúde mental são medidas urgentes - Foto: Shutterstock

Vale lembrar que a motocicleta é o veículo “mais fatal” no trânsito cearense, concentrando mais de 50% dos óbitos neste ano.

Ontem, uma pessoa tirou a própria vida no Ceará. Hoje, outra o fará. Ao fim do mês, terão sido, pelo menos, 41 suicídios. Essa é a média mensal trágica registrada no Estado, entre janeiro e maio de 2022, quando 207 pessoas – 171 homens e 36 mulheres – morreram por lesões autoprovocadas intencionais.

O dado alarmante, que reflete a gravidade de um problema de saúde pública, é do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), mantido pela Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), e, para se ter ideia, ultrapassa o número de mortos em acidentes de moto. O veículo que mais tira vidas, então, têm sido as próprias mãos.

Quem precisa de ajuda no Ceará pode buscar serviços públicos e gratuitos de assistência, como os CAPS, os núcleos de psicologia de universidades e o próprio Centro de Valorização da Vida (CVV), que atende pelo número 188.

O ano de 2021 foi o primeiro em que acidentes cotidianos, como os de moto, foram menos fatais que os suicídios no Ceará: 588 motociclistas e passageiros morreram após os sinistros, enquanto outras 673 pessoas cometeram suicídio.

Vale lembrar que a motocicleta é o veículo “mais fatal”. No Ceará, das 350 mortes no trânsito em 2022, 186 envolveram motos (53%). Já em Fortaleza, dos 184 óbitos nas vias no ano passado, 47% foram de pilotos ou passageiros, de acordo com o Relatório Anual de Segurança Viária.

É PRECISO QUEBRAR O TABU

Ao trafegar pelas ruas cearenses, é comum ver placas alertando sobre uso de capacete, cinto de segurança e sobre uso de álcool ao volante. Mas com quantos outdoors sobre saúde mental topamos no dia a dia?

Quando o assunto é prevenção ao suicídio, por ser delicado, o silêncio prevalece – inclusive entre profissionais de saúde, como lamenta a psiquiatra Luísa Weber Bisol, professora de Medicina Clínica da Universidade Federal do Ceará (UFC).

“Os próprios profissionais da saúde às vezes têm dificuldade de lidar com isso. Boa parte das pessoas que morreram por suicídio tinham estado em algum serviço médico 1 mês antes da sua morte. Há essa dificuldade de falar, de perguntar”, diz.

Um aluno me relatou que o paciente dele disse estar ‘com pensamentos negativos’. Perguntei quais pensamentos, o aluno respondeu: ‘não perguntei’. Mas quando a gente pergunta, abre espaço pra pessoa buscar ajuda. Quem se suicida está buscando um alívio do sofrimento, e não a morte.

LUÍSA WEBER BISOL

Psiquiatra e professora da UFC

A psicóloga clínica Cecília Alves avalia que a política de saúde mental no Brasil “precisa de muito avanço”, que o “Estado tem limitações”, e exemplifica que “temos Caps, com trabalho maravilhoso, mas em número insuficiente”.

A sociedade, então, precisa se aliar. Falar sobre o assunto.

“Quanto mais falamos sobre isso, tende a deixar de ser um tabu, assunto polêmico, e se torna um assunto que as pessoas têm interesse em entender para tomar atitudes preventivas. Quem somos nós quando vemos alguém em sofrimento?”, questiona Cecília.

COMO ESTÁ O TRABALHO DE PREVENÇÃO?

A psiquiatra Luísa Weber Bisol supõe que os registros de suicídios estão “mais fiéis à realidade do que há 10 anos”, já que uma lei de 2014 obriga a notificação imediata de tentativas, mas destaca outro dado preocupante.

“41 suicídios por mês no Ceará resultam em mais de 1 por dia, certo? E para cada suicídio, temos, em média, 20 tentativas”. Ou seja, é como se pelo menos 4 mil cearenses já tivessem tentado tirar a própria vida em 2022.

Temos uma realidade de desassistência em termos de saúde, uma estrutura absolutamente insuficiente. E ainda tivemos a questão do isolamento social, que impactou a saúde mental. Muitas pessoas nos procuraram mais por depressão, ansiedade e transtornos por uso de álcool e substâncias.

LUÍSA WEBER BISOL

Psiquiatra e professora da UFC

 -  Foto: JL Rosa

O enfraquecimento da rede de prevenção, como avalia a psiquiatra, pode ser demonstrado a partir de uma constatação: “temos 2 ou 3 hospitais psiquiátricos numa cidade com mais de 2 milhões de habitantes. Nos Estados Unidos, e aqui também, há uma relação clara entre a redução de leitos e o aumento dos suicídios”.

Além dos sociais, fatores econômicos também incidem sobre o aumento de suicídios. “Nosso país está mais pobre, as pessoas estão com mais dificuldades. Perda de emprego e dificuldade financeira são fatores de risco para suicídio”, cita Luísa.

Aspectos financeiros, assim como os genéticos e de saúde mental, também são pontuados por Mikkael Duarte, professor de psiquiatria da UFC em Sobral, como cruciais para a ocorrência de suicídios.

Transtornos mentais têm origem multifatorial, que vão desde vulnerabilidade genética até estressores ambientais, como mazelas sociais, pessoais, laborais. Imagino que estes últimos são os que incidem mais sobre os cearenses.

MIKKAEL DUARTE

Professor de psiquiatria da UFC

O professor aponta o fortalecimento dos serviços de atenção psicossocial, como os CAPS, como “um passo fundamental”. “Cidades com CAPS têm 14% a menos de suicídios. São importantes fatores de proteção”, destaca. “Outra possibilidade é o trabalho de desmistificação do tema junto à sociedade."

"A saúde mental historicamente recebe menos atenção (e verbas) dentre todas as áreas da saúde pública, provavelmente ainda como resquício da ideia eugenista e de segregação inerente à história da saúde mental dos últimos séculos", acrescenta Mikkael.

Crianças e adolescentes que têm transtornos graves e permanentes, mas não necessitam de atendimento urgente ou emergente, acabam por não iniciar o acompanhamento adequado, agravando os quadros existentes, segundo especialistas

"CASOS DE SUICÍDIO SÃO URGÊNCIA"

Fortaleza tem, hoje, 23 equipamentos na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS): 7 CAPS para Álcool e Drogas, 6 gerais e 2 infantis; 5 unidades de acolhimento e 3 residências terapêuticas.

O atendimento de quem tem ideação ou tentou suicídio, porém, é de urgência, como explica Arildo Lima, gerente da célula de saúde mental da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

Se um paciente chegar num dos nossos Caps e manifestar vontade de suicídio, ele é prontamente atendido. O atendimento é feito não só pelo psiquiatra, mas equipe multiprofissional, com psicólogo, assistente social e terapeuta ocupacional, para escuta qualificada.

ARILDO LIMA

Gerente da célula de saúde mental da SMS

O gestor ressalta, ainda, que a prevenção ao suicídio é uma ação conjunta e multisetorial, exigindo o apoio da família no diagnóstico precoce de fatores de risco, assim como acesso a esporte, educação, lazer e cultura são alguns deles.

A SMS citou, em nota, a existência da Rede Cuca, das Academias ao Ar Livre e das Areninhas como exemplos de espaços públicos que influenciam na saúde e na socialização das comunidades.

Caso você esteja se sentindo sozinho, triste, angustiado, ansioso ou tendo sinais e sentimentos relacionados a suicídio, procure ajuda especializada em sua cidade. É possível encontrar apoio em instituições como o Centro de Valorização da Vida (CVV), os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). O CVV funciona 24 horas pelo telefone 188 e também atende por e-mail e chat (acesse www.cvv.org.br). Os Caps oferecem ajuda profissional. No Ceará, procure os Caps (veja a relação completa das unidades de Fortaleza) e o Hospital de Saúde Mental, telefone: (85) 3101.4348.

Escrito por Theyse Viana/Diário do Nordeste

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